Até onde vai o perdão a líderes religiosos que corrompem seus fiéis?

21-01-2011 20:54

Reinhold Nielbuht, em seu livro Uma interpretação da ética cristã, fornece uma definição magistral sobre o perdão: “Amor que perdoa é uma possibilidade apenas para aqueles que sabem que não são bons, que se percebem necessitados da misericórdia divina, que vivem numa dimensão mais profunda e mais elevada do que aquela do idealismo moral; como seus semelhantes, são também convencidos do pecado por um Deus santo e sabem que as diferenças entre o bom e o mau homem são insignificantes a seus olhos”. Dá vontade de acreditar em cada uma dessas palavras. Contudo, o mais comum é desejar que certos tipos de pecadores – como pastores corruptos que violam flagrantemente seu chamado e nunca se arrependem – sejam relegados ao oitavo e nono círculo do Inferno de Dante.

Uma variada coleção de autores consagrados já escreveram sobre o assunto. Caso de Desmond Tutu, em Nenhum futuro sem perdão; de Dietrich Bonhoeffer, em Ética; ou L.Gregory Jones, em Encarnando o perdão. Todos eles oferecem uma ajuda honesta àqueles que possuem um coração com tendência a não perdoar, sobretudo, traições espirituais. Esses escritores lidam com o chamado para o perdão em face do mal real. Eles entendem que psicologia pop e teologia barata não dão conta disso. Mas as sociedades assassinas debaixo das quais a maioria deles sofreu – como a Alemanha nazista que levou Bonhoeffer à morte ou África do Sul racista que oprimiu Tutu – encontram seu correspondente cristão em igrejas que, por exemplo, permitem ou ignoram o abuso sexual de crianças e punem aqueles que chamam os abusadores à responsabilidade.

Certamente, não sou a única pessoa a ter uma longa história relacionada ao desvio de conduta por parte do clero. Talvez, eu traga a distinção de ter caminhado com um sobrevivente de abuso sexual e com a sua família na busca por justiça numa famosa megaigreja onde os mesmos foram vilipendiados pelos líderes por causa da sua decisão de processá-los – e por ter enfrentado um tratamento semelhante ao denunciar um suspeito de pedofilia naquela congregação. Dois anos depois de meu marido ter renunciado à posição pastoral nessa igreja, devido à corrupção sistêmica, nosso primeiro filho cometeu suicídio. Eu responsabilizo certos líderes da igreja por uma multiplicidade de pecados, começando com propaganda enganosa e terminando por levar muitos pequeninos – inclusive o meu – a tropeçar.

Não dá para acreditar que a diferença entre os pecados dos que consideramos “homem bons” e “homens maus” são insignificantes aos olhos de Deus. É só ler a parábola do filho pródigo para perceber que o Senhor sabe, sim, a diferença. Quando o obediente irmão mais velho questiona seu pai sobre o porquê de ele nunca haver matado “nem mesmo um cabrito” (Lucas 15.29) em sua honra, ouve como explicação que aquele seu irmão mais novo estava morto, mas havia revivido; estava perdido, mas fora achado. Essa é uma demarcação significante – a que descreve não apenas o amor do pai, mas também o arrependimento do pecador.

Em Mateus 18:1-10, Jesus ensina uma lição familiar que contrasta ambição desenfreada com fé imaculada. E inclui uma lista de consequências terríveis para aqueles que prejudicam o imaculado. “Quem recebe uma destas crianças em meu nome está me recebendo”, ele diz. “Mas, se alguém fizer tropeçar um destes pequeninos que creem em mim, melhor lhe seria amarrar uma pedra de moinho no pescoço e se afogar nas profundezas do mar”. Ao mesmo tempo, o Mestre enfatiza a possibilidade do perdão: “Se teu irmão pecar contra ti, repreende-o, e, se ele se arrepender, perdoa-lhe. E, se pecar contra ti sete vezes no dia, e sete vezes no dia vier ter contigo, dizendo: 'Arrependo-me'; perdoa-lhe.” A isso, os discípulos de Jesus compreensivelmente retrucaram: “Aumenta a nossa fé”. Então, o Senhor promete que, se eles tivessem uma fé tão pequena como a minúscula semente de mostarda, ela seria mais do que suficiente.

Absorver a injúria
Aqui reside o problema: arrependimento é tão difícil de ser medido quanto encontrado – e, na sua ausência, nós temos muito pouca capacidade para perdoar. Contudo, tenho visto líderes sendo repreendidos não apenas uma vez, mas muito mais que setenta vezes sete, e nenhum deles arrependeu-se abertamente ou foi reconciliado com as comunidades destruídas pelas suas ações. A jovem mulher que mencionei queria duas coisas: mudança numa igreja que teimosamente resistia a isso e um pedido de desculpas pela punição que ela e a sua família receberam nos anos que se seguiram ao seu abuso. Pois não teve nem uma coisa, nem outra. Ao invés disso, advogados negociaram o preço para uma desculpa e ela simplesmente recebeu uma quantia em dinheiro em troca do seu silêncio.

Como, então, podemos perdoar os líderes cristãos que nos traíram, na ausência de confissão e de visível arrependimento? Em sua obra Livre da carga – Dando e perdoando numa cultura desprovida de graça, Miroslav Volf, teólogo da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, diz: “Condenação não é o coração do perdão. É a pressuposição indispensável dele”. Ora, perdão que não leva a sério a ofensa contra a parte injuriada é fraudulento e barato. Perdão autêntico, escreve Volf – com a legitimidade de proceder de uma família que sofreu sob o regime comunista e ter visto seu irmão morrer num acidente que poderia ter sido evitado –, “corta o laço de equivalência entre a ofensa e o modo pelo qual tratamos o ofensor. Eu não exijo que aquele que tirou o meu olho também perca o seu e que aquele que matou meu filho por negligência também seja morto. Na verdade, eu não exijo que ele perca nada. Eu renuncio a toda retribuição. Ao perdoar, absorvo a injúria – da mesma forma que devo absorver, digamos, o impacto financeiro de uma má transação comercial.”

Na visão de Volf, disciplina é consistente com perdão. Então, criminosos devem ir para a cadeia e clérigos que violam o ensino da Igreja (ou a própria lei) devem ser destituídos de suas funções. Nossas leis proíbem, com razão, o assassinato, mas não a raiva – embora Jesus tenha dito que ambos tenham a sua fonte no coração humano. “Perdão”, escreve Volf, “nos põe no limite entre inimizade e amizade, entre exclusão e acolhimento. Ele derruba a parede de hostilidade que as más ações erigem; porém, não nos leva ao território da amizade.” “Frequentemente”, ele continua, “isso é o máximo que podemos reunir de forças para fazer, bem como é tudo que os nossos ofensores nos permitirão realizar”. Ele conclui que, no entanto, o perdão, na sua melhor manifestação, espera mais que isso.

Depois que eu e meu marido deixamos a grande igreja que nos abateu, tornamo-nos membros de uma comunidade Anglicana que estava sendo processada pela Diocese Episcopal de Los Angeles devido a uma disputa por propriedades. Seis meses depois, o reitor que havia conduzido nossa congregação para fora da Igreja Episcopal foi forçado a resignar sob a alegação de conduta inapropriada para com outro membro de sua equipe. Pois tal religioso mudou-se para outro estado e rapidamente assumiu o ministério junto a uma igreja-irmã. Ou seja, o reformador recusou-se a ser reformado. Enquanto isso, o sacerdote assistente, que havia escrito sua tese de mestrado sobre restauração de clérigos caídos, administrou a crise com considerável cuidado. Não havia dúvida de que o reitor se retiraria, ou que aquele atingido pelos seus avanços indesejados seria protegido. Reuniões públicas foram realizadas, onde os congregados puderam expressar sentimentos de traição e fazer perguntas. Foi-nos apresentado um diagrama de possíveis desfechos e fomos desafiados a não nos permitirmos sermos prejudicados pela falha do sacerdote.

Como essa nova comunidade de fé conduziu a crise com integridade, percebi minha restauração espiritual concernente às questões trazidas da igreja anterior. Meu marido e eu fomos então chamados para escrever uma carta aos nossos bispos descrevendo o nosso testemunho acerca das consequências de se ter um clero com má conduta que não é cobrado habitualmente. Líderes da igreja – que já têm pago um alto preço por seguirem suas consciências – ouviram-nos e nos deram apoio. Não somente isso: todo domingo, nós confessamos nossos pecados corporativamente e pedimos ao Senhor que nos perdoe, assim como perdoamos aqueles que nos ofenderam.

Por dois anos, muitas das minhas orações de confissão estavam relacionadas às ações que tomei em relação à igreja anterior. Não importa quão justa seja uma causa: quando alguém escolhe agir contra amigos e líderes espirituais – mesmo em comunidades onde o mandamento de Jesus sobre o perdão é usado para manipular e onde acusações de estarmos sendo vingativos são lançadas na direção de quem confronta aquele que fez o errado –, essa pessoa luta com a culpa. No entanto, semana após semana, eu tinha ali a certeza de que, através do corpo e do sangue de Cristo, todos nós fomos perdoados.

“Resistir à graça”
No período em que esteve envolvido na conspiração para assassinar Adolf Hitler Bonhoeffer escreveu: “Se é uma ação responsável; se é uma ação que diz respeito somente e inteiramente a outro homem; se isso vem de um amor altruísta pela pessoa real que é o seu irmão, então, precisamente por causa disso, não se pode querer evitar a comunhão da culpa humana.” A isso, ele acrescenta que “diante de outro homem, o homem de livre responsabilidade é justificado pela necessidade; diante de si mesmo, ele é absolvido pela sua consciência; mas, diante de Deus, espera somente por misericórdia”. A justiça das ações de Bonhoeffer ainda é debatida por teólogos e por descendentes de vítimas do Holocausto perpetrado pelo nazismo.

Assim são as ações de sobreviventes de abusos sexuais que processam suas igrejas por negligência. Em minha mente, não há dúvida acerca da justiça das duas causas em face do silêncio cúmplice do povo de Deus. No entanto, eu não posso falar sério em desejar o inferno para os líderes espirituais corruptos enquanto procuro me apegar à fé na misericórdia de Deus por meu filho e por mim mesma. O suicida lança sobre os que ficaram no seu rastro questões sem resposta e uma nuvem de culpa por pecados reais e imaginados. Assim, foi fechada em minha mente a distância entre mim e todos os clérigos que eu poderia tão facilmente condenar. Assim, cedo terreno em minha resistência à graça barata porque o meu coração não perdoador está quebrado e porque o pecador com o qual estou mais preocupada é o meu filho.

Quem sou eu para dizer que não vou perdoar, quando sei que somente Deus poderia condenar ou absolver ações humanas? Certamente, nenhum de nós é melhor do que os apóstolos que certamente entenderam o desafio que estava posto diante deles. E, como eles, diante de uma realidade espiritual inexorável, resta-nos suplicar: “Senhor, aumenta-nos a fé”.

Felizmente, há homens e mulheres que são capacitados para guiar discípulos empedernidos como cada um de nós. Em seu magnificente Encarnando o perdão, Gregory Jones, ex-reitor da Escola Duke de Divindade, oferece uma definição de perdão que é adequada para um mundo cheio de ambiguidades:

“Perdão não é tanto uma palavra dita, uma ação feita ou um sentimento. Ele é um modo encarnado de vida numa sempre profunda amizade com o Deus triúno e com os outros. Dessa forma, a responsabilidade de um cristão por perdoar não deve ser simplesmente, ou mesmo primeiramente, focada na absolvição da culpa; ao invés disso, deve estar focada na reconciliação do que foi partido, na restauração da comunhão – com Deus, um com o outro e com toda a Criação. De fato, por causa da onipresença do pecado e do mal, o perdão cristão deve ser, ao mesmo tempo, uma questão de compromisso com um estilo de vida; uma vida cruciforme de santidade, na qual nós procuramos ‘desaprender’ o pecado e aprender os caminhos de Deus, bem como os meios de buscar reconciliação em meio aos pecados particulares, instâncias específicas de quebrantamento.”

Cada um de nós vive em meio a pecados particulares e instâncias específicas de quebrantamento. E cada um de nós deve escolher como irá responder. Viver uma vida de santidade e aprender os caminhos de Deus algumas vezes vai significar deixar de lado nossa necessidade por justiça e, ao invés disso, acolher um mundo que geme em antecipação pelo dia quando ele, e nós, seremos redimidos. Isso significa aceitar com humildade que somente Deus é bom.

 

 

Por Christine A. Scheller - escritora e editora-colaboradora da revista Christianity Today

Tradução: Daniel Jr

Fonte: Cristianismo Hoje

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